Chegou
o mês de dezembro e com ele a minha tristeza, porque o natal está batendo a
minha porta e eu não tenho nada para oferecer.
Dentro
de casa, apenas uma pequena árvore, usada nos últimos dois natais, com os
mesmos enfeites. Não há peru, pernil ou comidas natalinas. Se tudo der certo,
comeremos um bife assado com arroz branco.
Os
parentes há tempo não se reúnem, seja por causa do dinheiro curto ou por não ter
mais paciência para solenidades. Também não ignoro porque nessas ocasiões um ou
dois seguram o peso das despesas porque somos todos filhos da pobreza.
Meus
filhos não terão presentes este ano, a menos que alguma boa alma lhes doe
alguma coisa. Já faz algum tempo que não compramos roupas novas para passarmos
o natal, e muito menos para o ano novo. No ano passado consegui um
dinheiro por conta de um trabalho extra e mandei a mulher comprar roupas para
as crianças. Sábia como é, ela advertiu a filha (vaidosa por natureza) a não
comprar roupas de festas porque depois não teria onde usa-las e gastaríamos
dinheiro à toa. O resultado foi que todos na igreja estavam com roupas chiques,
menos minha filha adolescente que não sabia onde enfiar a cara: Ela usava jeans
e tênis. Mas foi bom, usou a roupa o resto do ano.
O
natal para mim e a minha família é apenas mais um dia de feriado. Pelo menos é
feriado prolongado. Nesse dia ninguém em minha casa estará trabalhando, nem
estudando, mas brasileiro ama feriado, nem que seja para fazer nada. E isso nós
iremos fazer neste natal.
A
igreja já não tem o mesmo clima natalino de anos atrás. Pelo menos eu não acho
mais graça nas apresentações.
O mês de dezembro, para mim, parecia ser
a época mais mágica do ano: Era colorido, alegre e unia as pessoas. Hoje não
vejo mais nada disso! Os
olhos dos meus filhos não sorriem porque sabem que não ganharão presentes (e
natal sem presente não é natal).
Também não vamos a lugar nenhum, porque até os
lugares que são grátis, só o são em partes, porque ninguém pode levar lanche
sem dinheiro. E quando penso em passagens... Melhor mudar de assunto, pois
esse, definitivamente, não cabe no meu bolso.
Na
verdade, reparei que não somos a única família que não está no clima de natal.
Moro na periferia de uma grande cidade brasileira, e apesar de vivermos em uma
comunidade pobre, os moradores são animados para dias festivos. Porém, não vejo
tantos pisca-piscas nas janelas nem enfeites nas portas. Será que o povo está perdendo o
clima natalino ou sou eu que estou vendo tudo cinza?
O
que sei é que todo mês de dezembro eu retrocedo no tempo e percebo que existem
dois de mim: o antes e o depois do natal.
Antes
dessa festa, sou um pai de família digno, que batalha de todo jeito pela
sobrevivência dos filhos e da esposa. Alguém que sofre na vida, mas é feliz por
saber que é amado pelos seus. Alguém que paga as contas com dificuldade, e às
vezes nem pode pagar, mas é compreendido pela família que vê o meu esforço.
Depois
do natal sou um pai decepcionado que enfrenta olhos tristes, porque “todos”
ganharam algo e só meus filhos não puderam. Sou um marido vencido pela vergonha
porque as comadres foram à igreja de vestido e calçado novos e a minha esposa
preferiu não ir a passar vergonha. Sou um chefe de família sem sucesso porque
apesar de saber que meus filhos e minha mulher nunca me acusarão por não poder
pagar a conta de água, de luz ou de telefone, vão lembrar-se com tristeza desse dia sagrado que
marca a vida de tanta gente!
Não
gosto de lembrar-me do natal como o dia do nascimento de Jesus, porque Cristo
foi o único homem que deixou realmente algo que importava (a companhia de
Deus), e despojou-se de sua glória a fim de dividir sua vida e suas bênçãos com
os homens, atitude esta bem contrária ao natal que conheço, onde os homens
exploram o próximo e ostentam suas posses em detrimento a desgraça alheia.
Para
mim, o natal é o dia do nascimento da hipocrisia e do materialismo, onde se
julga as pessoas pelo que possuem e humilha-se ainda mais os que nada têm.
Já
me basta ser brasileiro e ter constituído família neste país hipócrita, no qual
meia dúzia de pessoas tem de tudo e todo o resto vive ao deus dará.
Se
já vivemos debaixo da punição de ser pobres, porque ainda precisamos de um dia
“especial” para nos punir?
Desculpe
o desabafo, mas apesar da vergonha em me expor, acho que se não abrisse meu
coração, morreria de tristeza.
Sem
mais,
Zé
Ninguém da Periferia.
Leila
Castanha
12/2013
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