Um objeto sobre o sofá da
sala, do tipo que já estou acostumada a ver. Um livro. Comum como qualquer
outro que já vi. Olho para ele e fixo o meu olhar para entender melhor o que
vejo. Sim, é um livro. Não, não é apenas um livro. É o livro. O livro dele. Aquele
objeto que passou por aquelas mãos grandes e másculas, e que por vezes foi
carregado repousando sobre o seu peito.
Sim, aquele peito no qual
eu desejava me reclinar. Olho para os lados. Ouço passos e recuo. Ainda não é a
hora certa! Aguço os ouvidos como um felino que se protege pelo poder de sua
audição. Certifico-me de que ninguém se dirige para aquele recinto. Estou só!
Somente eu e ele: Aquele precioso livro que mexe com cada partícula do meu
corpo e faz meus músculos se retesarem pela adrenalina que me causa.
Vagarosamente toco em sua
capa. Sinto-me tonta de prazer! Naquele momento não me vejo pegando em um
simples objeto de papel, mas toco nas mãos que dantes o tocaram. Encosto meus
dedos trêmulos sobre sua superfície como se estivessem em contato com o peito
que lhe serviram de suporte. Meu livro, meu santo mediador! Desejo usá-lo como
ponte entre mim e meu amor secreto.
Abro suas páginas
como se tivesse praticando os maiores dos pecados. Estou sentindo o cheiro do
perfume dele. A tentação é grande de encostá-lo sobre rosto, como se fossem
suas mãos. Medo de ser pega. Não posso passar esse mico se alguém resolver
entrar na sala nesta dita hora. Meu corpo treme e sinto o nervosismo me
possuir. Resolvo. Com as duas mãos o seguro firmemente e começo a levá-lo em
contato com meu rosto. Ouço passos e reajo pelo susto jogando o livro no sofá
onde o peguei.
Ele fala tudo e eu não ouço
nada. Meus olhos estão presos ao livro. Não, às suas mãos que seguram o livro.
Não, ao seu braço que estão presos às mãos que seguram o livro. Aos poucos,
subo os olhos e fixo, hipnotizada, aquele tórax desejado.
Sem entender nada do que ele diz, mas compreendendo bem o que sinto,
peço a gentileza de emprestar-me o objeto. Ele estende-o com uma das mãos para
que eu o pegue. Eu apanho o livro. Não, atrapalho-me e pego a mão dele que
segura o livro. Sinto os meus dedos gelados de pavor. Escorrego-os sobre os
dele num gesto rápido e nervoso. Agora peguei. Não, ele pegou minha mão que já
pegara o livro. Olhamo-nos, nos medimos com os olhos, pensamos horas em fração
de segundos.
O livro... Não sei onde parei a historia. Desculpe-me, não consigo
me lembrar de nada.
Ah, agora estou com ele! Não com o livro, mas com o dono
dele e do meu coração. Seus braços me recobrem e me acho debruçada sobre o seu
peito. Quanto tempo eu senti inveja daquele livro! Mas agora, finalmente,
chegou a minha vez!
Não o rosto dele, mas de uma mulher que se põe a minha
frente. Levanto-me de sobressalto e protesto enraivecida:
- Ah, mãe, isso é hora de me acordar?
Leila Castanha
Nenhum comentário:
Postar um comentário