sábado, 28 de setembro de 2013

DIREITOS CIVIS




A mulher sai do carro com o rosto coberto porque chora devido a tensão de ter um revolver apontado para sua cabeça. Duas horas de negociação e o jovem delinquente não aceita se render.  Ele, não precisa encobrir o rosto porque os seus direitos são claros: A tarja é colocada sobre sua face antes de sua insanidade ser exibida na TV.

A mãe se aproxima, meio distante, convencida pela policia de amolecer a consciência da prole. Ela, que bem o conhece, mantém certa distante e tenta colocar juízo na cabeça do filho rebelde. Do outro lado da cortina da violência, o juizado de menor lhe reforça o ato criminoso, soprando-lhe aos ouvidos os seus direitos.

À moça aterrorizada seus direitos já foram exercidos durante o ato criminal: Ela pôde tremer de medo,  não reagir para proteger a vida e  ainda teve o direito de esconder o próprio rosto ao chorar.  À ele, embora tendo  furtado o carro da vítima e a sequestrado, foi primeiramente vitimado pela sociedade que o tratou tão mal a ponto de induzi-lo a tais atos criminosos.

A moça não devia tê-lo tentado com o carro luxuoso ou a joia a  mostra. Ela pagou por merecer. Na verdade,  ela foi ainda mais sortuda que o pobre gatuno, que só lhe enfiou a arma na cabeça por causa de sua incompetência  como vítima que culminou em  alertar a polícia que lhe saiu a perseguição.

Como paga pelo insulto e intromissão, os policiais poderiam até prendê-lo, mas que, diante da imprensa lhe assegurassem os seus direitos civis.

Ela, já tem direitos por demais: Saiu com vida e a partir de amanhã poderá voltar a seus afazeres costumeiros. O carro, ainda que danificado na fuga, deve lembrar-lhe o quanto teve sorte por sair ilesa, enquanto que o pobre menor, vítima da sociedade, será carregado pelos homens de farda.

Ele vai para a Fundação Casa e enquanto aguarda seus direitos ficará um ou dois dias, talvez um pouco mais, bebendo,  comendo e dormindo a custa das contribuições de suas vítimas e planejando um novo esquema, que seja mais perfeito, já que o fato de ali estar denuncia a falta de sucesso de seu “trabalho” anterior.

Ela também vai para trás das grades. Não porque os tiras a levaram, mas porque as imagens de suas lembranças de terror encarceraram-na atrás de janelas engradadas e de portas trancafiadas, no lugar na qual costumava chamar de lar.

Ele, em breve estará nas ruas e ninguém saberá quem é,  porque sua imagem foi preservada.  Seus direitos se encarregaram de fazê-lo livre antes mesmo de sair da prisão.

Ela, não tem a menor ideia de quanto tempo ficará cativa de seu medo e se um dia poderá gozar a liberdade. Seu nome foi exposto na mídia e sua imagem divulgada aos quatro ventos.  Seu carro e seus pertences pessoais que exibia no dia do incidente a incriminará sempre de incitar a violência no coração do “pobre” menor. Assim, se conseguir sair do cativeiro doméstico que seu medo a encarcerou, dificilmente ficará livre do cárcere psicológico e talvez nunca mais se dê a liberdade de fazer ou de usar o que bem desejar. Sua liberdade será restrita, medida e avaliada a partir da suposta reação dos marginais que, por ventura a aguardam para um novo ataque. Assim será sempre escrava dos menores infratores tendo de assumir uma posição reflexiva, ponderando suas decisões, a fim  de não incitar o aparecimento do  monstro escondido no interior dos pobres infratores que se manifestarão diante de seus olhos na forma de vagabundos ambiciosos e invejosos que preferem  subtrair a somar na sociedade.

Mas os direitos humanos tenta gritar aos ouvidos dela que o pobre “garoto” que a aterrorizou não é tão mal assim, afinal, estava agindo sob o domínio da droga.

Ela que agia com clareza de mente,  talvez devesse ser mais cuidadosa e não despertar a avareza na “pobre” criatura que,  aos dezessete anos, ainda não passa de uma criança.

O jeito é calar-se, pois quando a injustiça grita, ela não consegue ouvir o bom senso, e sendo a justiça cega, não pode ver  as dezenas de cidadãos honestos que são trancafiados em suas casas  cada vez que um menor infrator é posto em liberdade.

Assim, sorrindo e zombando de suas vítimas, o marginal é solto enquanto no interior de sua casa, aos prantos e com medo da própria sombra, ela murmura impotente:

- E ainda se fala em direitos civis.

 

Leila Castanha

09-2013

 

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