Os dois se entreolham e as faíscas saltam de seus olhos enamorados. O sorriso de lado, quase fatal ao coração flechado, traz uma dor intensa, mas gostosa, que lhes consome a alma. A pulsação acelera-se como um trem desgovernado, onde o maquinista já não possui o comando, ele apenas observa seu trajeto rumo ao fim incerto. Tão incerto, que não se pode imaginar se o fim será de fato fim ou o começo de algo jamais vivido. A cabeça gira tonta envolta por milhões de pensamentos, e o cérebro procura governar o resto do corpo, mas os órgãos resistem-lhe como se entendessem que não há segurança em suas instruções. Os olhos desejam fitar o sujeito de seu martírio, mas não tem certeza de que o coração resistirá a esta visão ou explodirá num ataque fulminante. As mãos suam mesmo quando a temperatura está amena e o vento colabora em um dia de frescor. As pernas bambeiam ante a menor possibilidade de encaminhar-se em direção ao tal carrasco. Se teima, o coração ameaça saltar goela afora, mas se foge, ele retorce-se como quem sente que praticou a maior das idiotices. Um objeto banal que lhe passou pelas mãos torna-se algo sagrado e toda a insanidade desponta na ânsia de encostar-lhe à pele como que num contato indireto. A memória sofre colapsos constantes e entre uma e outra recordação, lá está o rosto, o corpo, a voz e até o silencio do alvo daquela imagem que se lhe impregnou à mente. Todas as pessoas são menos importantes quando comparados a ela. Os rostos são bem recordados diante de suas lembranças, mas a impressão é que aquele rosto em particular, ainda que desfeito em milhares de partículas, jamais será esquecido. Não só o rosto, mas as mãos, os dedos, as unhas, os maiores ou menores gestos, a boca, a voz e até o compasso da respiração gruda em nosso subconsciente que inconscientemente nos faz pensar, pensar e pensar a tal ponto de ser preciso extravasar esse congestionamento neural. Para tanto, haja papeis no mundo! Volta e meia e um rabisco aparece: Te amo! Amo você! Amo vc! Amo-te!I Love You!... Nada faz sentido fora dessa imagem e dessa lembrança intrusa e muitas vezes inoportuna, que não pede licença nem escolhe lugar ou hora para se apresentar. A noite chega e com ela vem a ansiedade do dia seguinte, e ao raiar o dia nasce com ele o desejo de acelerar as horas para se fazer clara de vez por todas a causa terminal dessa agonia. O coração sente-se totalmente perdido. Um prisioneiro em grades invisíveis. O individualismo do Eu já não é uma conquista, mas um tormento e o Ser único fica impregnado pelo Eu alheio. O sujeito não se reconhece mais, até se enoja de quão dependente tem se tornado do outro. Por mais que a razão diga que ele basta-se a si mesmo, todo o resto de seu ser lhe diz que não nasceu para viver só. Só, não quer dizer sem ninguém, mas sem o tal autor de seu suplício. Cria-se uma dependência dessa segunda pessoa que apesar da ordem cronológica, acredita-se que aquela vem antes de si próprio. Sim, o individuo atingido por essa seta passa a ocupar o segundo lugar na própria vida. Indecisão, medo e insegurança são os sentimentos bem reconhecidos por todos os poros de seu corpo. Pois é, o amor chegou!
Leila Castanha
2013
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